quarta-feira, 14 de maio de 2014

Cientistas descobrem vírus gigante na Amazônia

Fonte: Portal Amazônia 14/05/2014

Imagem do Samba Vírus obtida no Centro de Microscopia. Foto: Divulgação/UFMG
Imagem do Samba Vírus obtida no Centro de Microscopia. Foto: Divulgação/UFMG
MANAUS – Um vírus ‘gigante’ foi encontrado nas águas do rio Negro. O Samba Vírus – como foi batizado – possui genoma complexo, com genes só encontrados em células e que nenhum vírus de outra espécie codifica. Maior vírus isolado no país, ele sobrevive em ecossistema especial cuja dinâmica parece garantir uma existência equilibrada e harmônica com a ameba que o abriga e com um tipo pequeno de vírus que o acompanha de perto.
De acordo com o professor Jônatas Abrahão, o Samba também detém o maior genoma de vírus já sequenciado no Brasil. O coordenador do grupo responsável pela pesquisa afirmou que o genoma do vírus tem 50 mil pares de bases a mais que o do vírus protótipo APMV – primeiro vírus gigante a ser identificado no mundo -, que possui cerca de 1,2 milhão de pares de bases. “Percentualmente a diferença parece pequena, mas pode corresponder a diversos novos genes”, diz o professor. Tal diferença pode indicar, por exemplo, fatores relacionados ao ambiente em que ele foi isolado, como a intensa insolação e a acidez do rio, que é causada pelos resíduos de decomposição da floresta.

Outro aspecto focalizado pela pesquisa foi a inesperada presença – no entorno do Samba, dentro da ameba que ele habita – de partículas negras, que se mostraram eletrodensas na microscopia. “São virófagos já descritos na literatura como um vírus que infecta vírus gigantes”, explica o pesquisador. “É um mundo novo. O Rio Negro Vírus, como passamos a chamar essas partículas, assim como os outros virófagos previamente descritos, quebrou paradigmas, mudou nossa visão sobre virologia”, completa Abrahão. Sua ação foi testada contra o APMV e, de fato, foi possível perceber que esse virófago pode causar anomalias na formação e reduzir enormemente a multiplicação do mimivírus.
“Nossa hipótese é que o Rio Negro Vírus tem papel ecológico ao controlar a expansão do Samba Vírus, pois se houvesse vírus gigantes afetando amebas, livremente e de forma intensa, estas poderiam se extinguir localmente, e os vírus gigantes desapareceriam, por falta de hospedeiro”, explica Jônatas Abrahão. A pesquisa sugere que os três elementos – ameba, vírus gigante e virófago – estejam associados nesse ecossistema especial para manter uma coexistência equilibrada.
Sobre o tamanho do vírus, o pesquisador explicou: “comparada ao vírus da poliomielite, a proporção seria a mesma que entre um ser humano e o maior dinossauro já descrito no planeta”, estima o professor, referindo-se ao tamanho dos vírus gigantes, que oferecem estímulo à pesquisa não apenas pela dimensão, mas sobretudo pela complexidade genômica e estrutural.
À esquerda, Samba Vírus, que na imagem à direita está em várias etapas de formação. Os pequenos pontos que o cercam são o vírus Rio Negro. Foto: Divulgação/UFMG
À esquerda, Samba Vírus, que na imagem à direita está em várias etapas de formação. Os pequenos pontos que o cercam são o vírus Rio Negro. Foto: Divulgação/UFMG
Prospecção
Os resultados da pesquisa do Samba Vírus acabam de ser publicados na revista Virology Journal. Os dados chegam à comunidade acadêmica exatamente dez anos depois da publicação do estudo francês que caracterizou o Acanthamoeba polyphaga mimivirus (APMV), primeiro vírus gigante a ser identificado no mundo. Segundo Jônatas Abrahão, quando isolado, ainda no começo dos anos 1990, o APMV foi confundido com uma bactéria, e só na década seguinte foi corretamente caracterizado, dando início a uma série de estudos genéticos que revelaram a existência dessa nova família – os mimivírus.
A descoberta não surgiu por acaso. Interessado no tema, Jônatas Abrahão (em foto de Foca Lisboa) organizou em 2011 uma expedição a Manaus, para fazer prospecção de vírus gigantes. “Percorremos cerca de 50 quilômetros no Rio Negro, coletando amostras”, relembra o pesquisador, destacando que, embora a Amazônia seja símbolo da beleza e da biodiversidade no país, quase não há dados sobre vírus relacionados à região.
Outros biomas figuram no trabalho de prospecção liderado por Abrahão. “Estamos provando que os vírus gigantes existem em todos os ambientes – temos coletado amostras em lagoas urbanas e de solos em várias regiões do país”, informa.
Entre os mimivírus já isolados, mas ainda não caracterizados geneticamente pelo grupo, estão o Niemayer Vírus, encontrado na Lagoa da Pampulha, em frente ao Museu de Artes; e o Cipó Vírus, localizado na Serra do Cipó. “Onde há matéria orgânica, como lagoas, há amebas. E amebas podem conter vírus gigantes. A lógica é essa”, diz o pesquisador, que também está investigando a presença desses microrganismos no Pantanal mato-grossense.

Nenhum comentário:

Postar um comentário