terça-feira, 1 de junho de 2010

Floresta Amazônica: um mosaico cultural que o Brasil desconhece

Colaboração do Daniel Soeiro

Floresta Amazônica: um mosaico cultural que o Brasil desconhece

Por Natalia do Vale
A floresta amazônica brasileira tem cerca de 13 milhões de habitantes, segundo dados do IBGE. Destes, 300.000 são migrantes que vieram principalmente do Nordeste, atraídos pelo sonho de ganhar dinheiro trabalhando em madeireiras, mineradoras, criação de gado, plantio de soja, milho e outros produtos agrícolas. Além do sonho de ter um futuro melhor, estes trabalhadores trazem na bagagem os costumes de seus lugares de origem e uma infinidade de novas histórias, que contadas com sotaques diferentes, se misturam à cultura dos mais de 162 grupos de índios da região, formando um verdadeiro mosaico cultural.

Se por um lado esta mistura ajudou a construir as bases culturais da região e tornou a área ainda mais heterogênea e culturalmente rica, por outro lado, o contato com o branco e com a cultura trazida de fora, trouxe prejuízos aos índios, que tiveram seus costumes e hábitos modificados pela migração. Dados da Fundação Nacional do Índio- FUNAI, divulgados em 2008, mostram que cerca de 60% dos 270 mil indígenas recenseados no país vivem na Amazônia, entre je-aimorés, botocudos, apinagés, xavantes, tupi-guarani, tupiniquins, tupinambás, tamoios, carijós, caetés, yanomâmis. Das 162 tribos existentes na região, apenas 16 rejeitam o contato com não-índios e mantém intactos seus costumes.
Hoje, é comum andar pela Amazônia e ver índios vestindo calças e camisas, bebendo cachaça, fumando cigarro, comendo alimentos que não fazem parte de sua cultura, dirigindo carros e com inúmeras doenças até então desconhecidas por eles. Isso porque, com a chegada dos ‘brancos’, os índios foram tendo contato com um estilo de vida muito diferente do seu e muitos, por acharem as novidades positivas ou por pressão dos demais membros da tribo ou dos próprios ‘brancos’, aderiram aos novos hábitos alterando não só as relações internas, mas também, a saúde e a qualidade de vida nas tribos.
Forma e conteúdo
Para o general Eduardo Dias Villas Boas, chefe da Assessoria Especial de Gestão de Projetos do Estado Maior do Exército, a aculturação indígena é inexorável e apenas ações coordenadas pelo governo e pela população poderão amenizar seus impactos: “é quase impossível monitorar e impedir o contato do índio com os que chegam à região. O melhor a se fazer, na minha opinião, é tornar esta convivência menos nociva restringindo o seu foco apenas à assistência social e médica, evitando ao máximo o contato direto através da ajuda de projetos sociais e do exército, que já faz um trabalho parecido na região”, diz em entrevista coletiva ao projeto Repórter do Futuro.
Denis Lerrer Rosenfield, professor de história e filosofia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, acredita que os processos de aculturação decorrem de vários fatores, desde os que, aos nossos olhos, parecem menos nocivos, como o uso de vestimentas, até modificações religiosas, que alteram profundamente o modo como um povo se representa e se sente: “a introdução de novos hábitos e tecnologias transforma a rotina dos índios e muda completamente as relações de poder que eles mantém entre si. Hoje, o cacique muitas vezes, é o mais moderno e não o mais velho da tribo. É um processo cada vez mais comum e perigoso”, explica.
Para o filósofo e historiador, a solução para o problema também está na ação cautelosa e planejada de políticas sociais que possam minimizar este processo: “a introdução de novos elementos a cultura indígena é inevitável. O que podemos fazer é minimizar os seus efeitos do ponto de vista social, o que significa uma melhor e mais humana integração dessas tribos à sociedade brasileira.”
Já para o sertanista e indigenista Carlos Meirelles dos Reis Júnior, que vive na região do rio Envira, no oeste do Acre, onde vivem índios isolados do contato com a sociedade, a aculturação pode ser evitada sim e só depende do esforço de gente que trabalhe por esta causa. Ferido no lado esquerdo do rosto por flechadas disparadas por índios que o atacaram enquanto pescava, Carlos conta que o que mais o assusta não são os índios e sim, a aculturação dos mesmos: “eles sofrem dois impactos depois do contato: a doença, até criarem resistência, mais da metade já morreu, e a violência psicológica causada pela nossa tecnologia que muda a vida deles radicalmente. A reação violenta contra o branco é apenas uma reação à agressão cometida contra eles.” “O ideal é mantê-los em terras demarcadas, isolados do contato com o branco, só assim é possível preservar sua cultura e tradição”, finaliza.

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