quinta-feira, 28 de agosto de 2014

Economia verde busca diferencial na disputa por crédito

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Fonte: Valor Econômico 28/08/2014 
Embora o desenvolvimento sustentável esteja na pauta pública e privada brasileira há anos, o nível dos investimentos empresariais e do volume de financiamentos concedidos pelos bancos privados ainda é baixo para promover uma mudança significativa, apesar de não faltarem recursos.  Hoje, há um consenso entre os agentes econômicos de que é necessário entrar em uma nova etapa, na qual os projetos ligados à sustentabilidade se apresentem como uma solução de negócios tão competitiva como qualquer outra dentro das empresas e para os bancos.  Este estágio passa pela criação de mecanismos que permitam avaliar o impacto nos custos e o retorno dos projetos, além da capacidade de formatar produtos de acordo com as oportunidades proporcionadas pela economia verde.

"Não estamos mais no marco zero, mas em um período de transição, com avanços em várias áreas.  O problema é que ainda não temos escala", resumiu a presidente do Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (Cebds), Marina Grossi, durante o seminário "Ação 2020: Soluções de negócios para um país sustentável", realizado terça-feira, que debateu os desafios do financiamento à sustentabilidade.

"Às vezes um plano de eficiência energética, por exemplo, entrega competitividade, mas nem sempre há profissionais capazes de medir todos os efeitos relacionados ao programa na própria empresa, que acaba escolhendo outro projeto, com avaliação mais completa", afirma João Carlos Salgueiro, gerente de eficiência energética da Schneider Electric.  Segundo ele, a empresa dispõe de metodologias que equiparam as análises, mas é fundamental que empresas e bancos desenvolvam um processo estruturado, criando uma métrica de acordo com as peculiaridades dos projetos ambientais e capacitando técnicos, o que dará mais agilidade aos financiamentos.

"Há casos em que os pedidos das empresas passam por tantas etapas que a resposta dos bancos demora a ponto de tornar inviáveis os projetos.  O timing é diferente", diz Fernanda Gimenes, coordenadora da assessoria técnica do Cebds.

Para Carlos Nomoto, diretor de sustentabilidade do Santander, métricas, avaliações de risco ambiental e avanços na regulação - como a Resolução 4.327, do Banco Central que fixa diretrizes da política de responsabilidade socioambiental para instituições financeiras -, são imprescindíveis, mas é hora de ir além e descobrir meios para identificar os setores promissores da economia verde.  "É hora de sair do 'do not harm' para o 'do good', do 'não fazer mal, para fazer o que é bom'.  Criar estes mecanismos vai permitir que os investimentos sejam direcionados a inovações tecnológicas, novos modelos sociais, economia de baixo carbono, etc.."

Nomoto cita o caso do programa Reduza e Compense, parceria do Santander com a Sustainable Carbon que permite que as pessoas calculem suas emissões de gases de efeito-estufa e possam compensá-las comprando créditos de carbono de projetos certificados.  "Temos em nossas carteiras pequenas e médias empresas que geram créditos.  É difícil contabilizar a rentabilidade neste programa, mas com ele estamos ajudando a formar novos mercados", afirma.

Na Votorantim, um projeto iniciado em 2006 para aumentar a eficiência energética nas fábricas acabou proporcionando uma experiência bem mais ampla na área de sustentabilidade.  Na época, o grupo promoveu uma análise detalhada dos processos produtivos para entender seu balanço de energia, detectar desperdícios e descobrir onde estavam as oportunidades de negócios com reaproveitamento de resíduos sólidos.  "Com isto, criamos uma base de dados incrível, que usamos até hoje.  Só com a adoção de uma métrica para acompanhar os processos, conseguimos fazer ajustes que resultaram em um ganho de 4% em eficiência no primeiro ano -sem investimentos.  A meta era de 3%", conta o gerente-geral de sustentabilidade da Votorantim, David Canassa.  Ao mesmo tempo, o grupo foi descobrindo dificuldades específicas da área de sustentabilidade.

"Um exemplo: imagine a situação em que uma empresa precisa substituir equipamentos para aumentar sua eficiência energética, mas o mercado está comprador.  Neste momento, diante de vários projetos, certamente terão prioridade os que vão ampliar a capacidade de produção", afirma Canassa.  Outro problema, em um caso como este, é que a produção terá de parar na hora da troca de equipamentos.  "São questões que exigem soluções mais inteligentes do que as atuais."  Uma das propostas reforça a necessidade de maior capacitação na área de financiamento bancário, pois "tudo o que o banco não conhece se traduz em maior risco, maior taxa".  Já na esfera do governo, afirma Canassa, poderiam ser criados incentivos para compensar as desvantagens em relação a outros tipos de projetos.  "Não precisamos de grandes reformas, mas de microrreformas em que bancos, empresas e governos comecem a limpar as arestas e fazer com que este fluxo de informações e ideias ajude a alavancar os investimentos."

Hoje o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) é o principal financiador de projetos de longo prazo, com várias linhas para a economia verde, que recebeu R$ 24,4 bilhões em 2013.  "Vamos continuar acompanhando as oportunidades para criar novos produtos e apoiar as empresas nesta área", diz José Guilherme Cardoso, chefe do departamento de meio ambiente do banco.

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