Fonte: EcoDebate
, 22/08/2014
“O governo está restringindo a Convenção 169 da OIT após a decisão tomada. Desse modo, Tapajós será construída, então dificilmente o posicionamento dessas populações será considerado, porque a decisão política já está tomada”, lamenta o coordenador do Instituto Socioambiental – ISA.
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Foto: www.radioprogresso640.com.br |
“Qual modelo de desenvolvimento e ocupação que nós queremos na Amazônia? A construção das hidrelétricas que estão sendo feitas corresponde ao modelo que se deseja?”, questiona André Villas-Bôas em entrevista àIHU On-Line, concedida por telefone. Na avaliação dele, é um equívoco “achar que as hidrelétricas não são uma força de atração de um conjunto de investimentos que acabam modelando a forma que estamos ocupando aAmazônia”.
Entre os empreendimentos questionados na Amazônia, Villas-Bôas destaca a construção da hidrelétrica de Belo Monte, que está com 50% das obras concluídas, e a hidrelétrica deTapajós, que ainda está no projeto. Diante do processo de deliberação acerca desses empreendimentos, o indigenista chama a atenção para a necessidade de que a Convenção 169 da OIT seja vista como “uma oportunidade para se entender amiúde quais as preocupações dos povos indígenas em relação aos impactos desses empreendimentos sobre eles”, já que a consulta pública não tem o poder de interferir nas decisões políticas. “Mesmo que o governo tome uma decisão a despeito do posicionamento dos índios, com base na consulta, ele pode talvez melhorar as medidas mitigatórias e compensatórias a partir desse diálogo que se estabelece”, reitera.
André Villas-Bôas esclarece ainda que a construção de hidrelétricas traz uma série de outras implicações na Amazônia, desde a exploração ilegal madeireira até o avanço de especulação em torno da mineração, o que gera uma tensão entre as comunidades indígenas, agricultores, grileiros e extrativistas, porque eles disputam “terras públicas que ainda existem nessas regiões, tanto no Tapajós quanto na região do Xingu”.
Para ele, a solução da questão indígena passa pela postura do Estado brasileiro de “incorporar a existência desses povos como um patrimônio e não um ‘estorvo’, como parecem entender alguns segmentos da sociedade brasileira”. Dessa forma, enfatiza, as “políticas têm de ter condições de se adequarem às diferenças deles e, nesse sentido, deve haver um cuidado maior por parte do Estado brasileiro para adequar as políticas ao perfil deles. Isso dá trabalho, mas existem antropólogos, pessoas que entendem e que estudam essas populações, lideranças que conseguem falar português e línguas indígenas. Então, há condição de criar políticas através de um diálogo, sem preconceito, discriminação ou ignorando essas diferenças culturais e fazendo políticas homogêneas que desconhecem as diferenças desses povos”.
E acrescenta: “Esse é o desafio, e para aceitá-lo o Estado tem de olhar essa população indígena como patrimônio do passado e do futuro do Brasil. Enquanto estivermos divididos, com uma visão de que índio é coisa do passado, e que a presença deles é uma ameaça ao desenvolvimento brasileiro, como os ruralistas têm colocado, realmente será difícil superar esse embate e haverá mais preocupações em relação a conflitos futuros”.
André Villas-Bôas é coordenador do Instituto Socioambiental – ISA.
Confira a entrevista.